postado em 14/11/2021
*Texto publicado originalmente no O Globo
No dia 18 próximo, comemoraremos a criação, no Brasil, da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011). Mas será que o país tem mesmo algo a celebrar?
Em primeiro lugar, para entender a importância dessas datas, é bom lembrar que políticas públicas têm impacto central na vida das pessoas, para o bem ou para o mal. Podem significar a diferença entre a vida e a morte, entre a saúde e a doença, entre ter ou não acesso a educação, moradia de qualidade, saneamento básico e segurança.
Monitorar e discutir a eficiência de políticas e o uso de recursos públicos, além de pressionar o Estado para utilizar o Orçamento na ampliação do acesso a direitos, é responsabilidade de todos nós. Para tanto, dados de qualidade que permitam avaliar o funcionamento das instituições devem estar disponíveis, sempre.
Em tese, a Lei de Acesso à Informação (LAI) é um mecanismo que deveria facilitar o acesso aos dados das instituições públicas. Simples, não é mesmo? Nada simples. Ao contrário, a busca por informações nas mais variadas áreas é tarefa inglória e, na área da Justiça criminal, a procura é capaz de enlouquecer o mais sereno dos analistas.
As pesquisadoras envolvidas no projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) que teve por objetivo calcular o custo da implementação da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) para as instituições do sistema de Justiça Criminal — no Rio de Janeiro e em São Paulo — tiveram de acionar a LAI 112 vezes.
Para entender como são gastos R$ 5,2 bilhões num único ano para proibir determinadas drogas, nesses dois estados, foi necessária muita perseverança. Dados que deveriam estar facilmente disponíveis para pesquisadores e gestores públicos são ocultados e, pior, muitas vezes nem produzidos. Prazos legais para resposta das instituições são descumpridos, e informações negadas sem pudor.
Das 112 vezes em que a LAI foi acionada no âmbito da pesquisa, obtiveram-se respostas em 105 dos casos, o que poderia ser fantástico, não fosse a baixa qualidade da informação, que tornava seu uso muitas vezes impossível. E, pior, percebeu-se que, frequentemente, as instituições não produzem dados elementares.
Foram analisados os orçamentos das polícias Civil e Militar; do Ministério Público, da Defensoria Pública e do Judiciário; dos sistemas penitenciário e socioeducativo. Para absoluta estupefação dos pesquisadores do CESeC, as informações mais elementares sobre o número de inquéritos relatados pela Polícia Civil do Rio de Janeiro ou os boletins de ocorrência produzidos pelas Polícias Militares absolutamente não existem ou, quando existem, são ocultadas ou camufladas.
Faltam informações sobre as rotinas operacionais das instituições, que acabam funcionando às cegas. É o caso das Polícias Militares do Rio e de São Paulo, que não contabilizam e/ou não divulgam o número de operações policiais.
Como fazer gestão e planejamento sem informações básicas sobre o funcionamento das instituições? Como alocar recursos públicos dessa forma? Bom acentuar que a ausência da produção e sistematização de dados não acontece por acaso, mas atende a interesses políticos. O atraso intencional na realização do Censo, marcado originalmente para 2020, é exemplo desse descaso, que desemboca na formulação de políticas públicas sem informações essenciais sobre a população brasileira.
É urgente a criação de uma cultura de produção de dados com garantia de acesso a eles por pesquisadores, gestores e pela população em geral. Lutar pela democracia também é lutar para que as instituições prestem contas do que fazem. Transparência faz bem à democracia.
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